Alepe gasta R$ 23 milhões com verba indenizatória

Entre 2015 e 2017, Alepe gastou mais de R$ 23 milhões em verbas indenizatórias / Foto: Filipe Jordão/JC Imagem

Vinte e três milhões de reais. Foi essa cifra nada modesta que os deputados estaduais de Pernambuco gastaram a título de verba indenizatória entre 2015 e 2017, os três primeiros anos do atual mandato. O levantamento é da ONG Cidadão Fiscal, criada no intuito de fiscalizar despesas do poder público no Estado. Por mês, a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) permite que cada deputado peça o ressarcimento de até R$ 15.450. A lógica é a mesma daquele profissional que participa de um evento de negócios em nome da empresa e precisa almoçar fora. Ele traz o cupom fiscal, e é ressarcido pela companhia.

No caso da Alepe, 39 dos 54 parlamentares que passaram pela Casa nos anos de 2015, 2016 e 2017 gastaram mais de 90% do que é permitido de recursos. Três deles pediram todos os meses reembolso de R$ 15.450 – o valor máximo permitido. É o caso de Henrique Queiroz (PR), Everaldo Cabral (PP) e Lula Cabral (PSB). Este último, deixou o mandato em 2017 para assumir a prefeitura do Cabo de Santo Agostinho e foi preso pela Polícia Federal no mês passado na Operação Abismo.

“O que nos surpreendeu foi que todos os deputados estaduais buscam maximizar o uso da verba. Inclusive, três deputados estaduais gastaram exatamente o teto das verbas indenizatórias em todos os meses do mandato. Não economizando nem sequer um centavo”, diz Pedro Cunha, membro da ONG Cidadão Fiscal. “Usamos os dados de 2015 a 2017 porque os deputados têm até o final do ano para reportar gastos. Nosso levantamento mostrou que 16 deputados gastaram acima de 99% do teto. Ou seja, mais de R$ 15.289”, ressalta.

O maior gasto foi com a rubrica de aluguel de veículo, passagens ou hospedagens, que consumiu R$ 6,1 milhões. Em seguida, os parlamentares gastaram R$ 6 milhões com consultorias jurídicas ou assessorias técnicas. Só as despesas com material de expediente, cópias e encadernação somaram R$ 2,4 milhões. O levantamento também mostrou que os parlamentares concentram gastos nas mesmas empresas. O balanço aponta que 20 fornecedores receberam 40% de toda a verba indenizatória paga pelo Legislativo.

Os dados mostram que apenas quatro deputados gastaram menos de 70% do que era permitido aplicar em verbas indenizatórias: Vinícius Labanca (PP), Edilson Silva (PSOL), Adalto Santos (PSB) e Priscila Krause (DEM). “Fiquei até surpreso quando soube que era o segundo que menos gastou. Realmente, não fiz isso propositadamente. Estava ali usando o que era necessário com o que estava correto de gastar. Usei para alugar duas salas que transformei em escritório para comportar toda a minha equipe e receber demandas. E também para impressões e outras coisas esporádicas. Você tem que comprovar o gasto porque há uma auditoria muito rigorosa da Casa. Pelo menos comigo, sempre foi rigorosa”, explica Edilson. Labanca não quis comentar.

Falta transparência

De posse do levantamento sobre o uso generalizado da verba indenizatória, a ONG Cidadão Fiscal vai entrar agora com requerimentos para ter acesso às notas fiscais apresentadas pelos deputados para comprovar os gastos alegados. Ao contrário do Congresso Nacional, onde cópias das notas fiscais são disponibilizadas online para consulta de qualquer cidadão, o site da Alepe não permite conferir os documentos. A página também não permite fazer um download da base de dados sobre as despesas dos parlamentares, o que tornaria o levantamento dos gastos mais rápido e transparente.

Duas reportagens do Jornal do Commercio serviram de inspiração para a fundação da ONG Cidadão Fiscal. Em agosto de 2017, um levantamento feito pelo jornal mostrou que 20 deputados e dois ex-deputados haviam gastos R$ 1,7 milhão em verbas indenizatórias com empresas que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) apontava serem “fantasmas”. Em seguida, o JC revelou que as companhias eram operadas por ex-comissionados em pequenos imóveis no Recife e em Olinda.

Na época, os parlamentares anunciaram que devolveriam os recursos ao erário. “A partir disso, a gente ficou curioso em entender como são usadas essas verbas. A gente teve uma dificuldade inicial de obtenção de dados por conta da inacessibilidade do site da Alepe. Então programamos um robô para fazer essa análise. No momento em que nós analisamos os dados, pudemos perceber essas curiosidades que a gente está comentando agora”, diz Pedro Cunha. “Um dos motivos de a gente estar analisando verbas indenizatórias é porque são justamente nesses pequenos gastos que a gente pode encontrar comportamentos suspeitos de uso de verbas irregulares”, diz.

Respostas

Em nota, a Alepe informou que a verba indenizatória é destinada exclusivamente ao ressarcimento das despesas relacionadas ao exercício do mandato parlamentar e é concedida “mediante solicitação de ressarcimento formulada pelo deputado, com a apresentação de documentação fiscal comprobatória dos gastos”. A Casa também informou que não há obrigatoriedade legal para a disponibilização das notas fiscais das despesas no site, mas que qualquer cidadão pode solicitar esses documentos por meio do Serviço de Informação ao Cidadão.

A assessoria de Henrique Queiroz disse que a verba indenizatória é prerrogativa legal usada para manter ações políticas em todo o Estado e listou despesas como transporte, acomodação e divulgação do trabalho parlamentar como aplicação dos recursos. Também garantiu que os serviços terceirizados são realizados de fato por empresas sérias e legais.

A assessoria de Everaldo Cabral informou que os recursos são utilizados seguindo todas as normas e são empregados em despesas como a locação de carros, uma exigência do mandato, e com o custeio de assessoria jurídica.

Por Paulo Veras

Foto: Filipe Jordão/JC Imagem

 

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