Edilson Xavier*
A exemplo da Primavera de Praga em 1968, quando o povo Tcheco acordou da letargia apoiando o Primeiro Ministro Alexander Dubcec, contra o domínio Soviético, cujo movimento libertário foi sufocado pelos tanques de Moscou esmagando a primeira tentativa contra o regime socialista que denominava o Leste europeu, os jovens e a classe média brasileira resolveram deixar a apatia de lado e foram às ruas. Não se dizia que os brasileiros eram passivos demais, sem consciência política? Em todo o mundo parecer haver um conflito entre a juventude e a política, pois os jovens não se sentem representados pelos partidos políticos de mentirinha. Querem respostas rápidas às suas novas demandas.
Desde as greves do ABC em 1980 que grandes manifestações de rua ocorrem sem que Lula e o PT estejam na frente das massas. E dessa vez não dizem palavras utópicas e desconexas. Eles bradam contra os gastos com a Copa do Mundo, o distanciamento dos poderes das demandas populares, os gastos excessivos do Estado e o custeio da máquina e falê4nfcia na defesa dos interesses coletivos. A luta contra corrupção, que é uma praga em todo o Brasil, a má administração pública e a má qualidade do transporte público, a falta de segurança, de saúde e de educação de qualidade. Muita coisa vinha povoando o desgosto das pessoas nos últimos anos e entrou na lista como as humilhantes filas do serviço de saúde, a cachoeira de denúncias de corrupção, as macabras estatísticas de mortos e feridos nas rodovias precárias, tudo sob a alegação de escassez de verbas, apesar dos gastos exorbitantes com a construção a toque de caixa de monumentais estádios, mesmo nas cidades em que os melhores times não alcançam as divisões de elite do futebol brasileiro.
Os jovens e a classe média navegam na inflação alta, na queda de aprovação do governo, contra o aumento das passagens de ônibus e a vaia na abertura na Copa das Confederações e foi ás ruas, fazendo sua Primavera brasileira. O povo está apoiando. E em se tratando de um movimento aparentemente sem raiz partidária, há que se ter cuidado para que o instituto da multidão não seja orientado para o pior – pois embora seja romântico o grito pela mudança, não há revolução acéfala, e a história já demonstrou o mal que pode causar a manipulação coletiva. Em 1968 esse movimento contaminou o mundo. Intitulado “Democracia Não Tem Fronteiras”, o movimento “apartidário” critica abusos de poder público e pede educação, Saúde e Transporte e tudo isso pode ser feito, basta os políticos não serem corruptos e haverá recursos, já que se paga a maior taxa de impostos e temos os piores serviços públicos. A população está mais exigente e, parece cansada de esperar melhorias que nunca chegam, como uma obra prometida com a Transposição ou um serviço de transporte público mais decente. A inflação que está voltando tirou renda das famílias, que já está muito comprometida com o pagamento das dividas e o país não cresce. A perspectiva é de inflação alta e os juros subindo e encarecendo as dividas.
O país está envolto em criminalidade e impunidade e sequer se cogita de alterar a maioridade penal e o Congresso Nacional não legisla, e o que causa perplexidade é a tentativa de aprovar a PEC 37, que inibe as investigações de roubalheiras pelo Ministério Público, beneficiando os políticos que estão ávidos para não serem investigados. O Senado e Câmara dirigidos por Renan Calheiros e Henrique Alves, processados improbidade, clamam por impunidade. Essa combinação de Ministério Público sem direito de investigar e fiscalizar as policias com chefes investidos do direito de tirar o inquérito criminal das mãos dos delegados parece muito ameaçadora à justiça e à moralidade pública.
É isso que os políticos esperam, mas se esquecem que o povo está de olho neles e o levante popular constitui certeza que pagarão caro pelos atos de corrupção e má utilização dos impostos que pagamos. E o que se vê? Gestões desastradas, não existe aterro sanitário. Lixões estão em todas as cidades.
Ao mesmo tempo, a maioria desses gestores gastam fortunas nas festas de São João, Carnaval e dos padroeiros. No final das gestões, surgem os desfalques e falcatruas de toda ordem. Querem o que? Que o povo continue apático? Engano d’alma ledo e cego, como dizia Luis de Camões. O Movimento Passe Livre se inspira nos movimentos de jovens que nos últimos anos tomaram espaços públicos no Oriente Médio, na Europa e nos Estados Unidos. Apesar de se dizerem apartidários, vários dos adeptos do MPL defendem idéias revolucionários e de esquerda e se recusam de lideranças tradicionais. Por oposição a partidos políticos ou organizações hierarquizadas, eles postulam um movimento sem hierarquia. Todos protestam em meio ao que chamam de “crise do capitalismo”.
Em meio a tudo isso, a Presidente Dilma subverteu o regime de governo, que é uma democracia representada por ministros e lideres na Câmara e no Senado. Com eles deveria reunir-se em regime de urgência. Ao contrário, reuniu-se com Lula, que atua numa espécie de “Primeiro Ministro”. Há um Conselho da República com 14 membros previsto na Constituição Federal, cuja função é aconselhar a presidente em casos de instabilidade política. Enquanto isso, vamos bancar a Copa do Mundo mais cara da história: 28 bilhões, que daria para revolucionar a educação, saúde, transporte público, segurança e rodovias. A fortuna daria para construir e equipar mais de 90 mil postos de saúde, comprar 350 mil ambulâncias, contratar mais de 2 milhões de professores por ano ou construir quase 25 mil km de rodovias asfaltadas.
Por fim, “O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas”, disse o pensador alemão Bertold Brecht.
Edilson Xavier é ex-presidente da Câmara Municipal e da OAB de Arcoverde.