Um triângulo amoroso entre um homem e duas mulheres terminou com uma ação surpreendente na Justiça. Após a separação, uma das companheiras, que foi considerada a amante por 33 anos, decidiu entrar com um pedido de reconhecimento de união estável junto ao Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e teve o direito reconhecido pela 5ª Câmara Cível. A novidade é que, pela primeira vez em Pernambuco, a Justiça reconhece a união estável entre duas mulheres e um só homem. O entendimento dos magistrados possibilitou que a autora da ação e seus dois filhos conquistassem, após o fim do relacionamento, direito aos bens que antes eram direcionados apenas à outra mulher, considerada a esposa.
O desembargador relator da ação, José Fernandes Lemos, explicou que o reconhecimento da união estável somente foi possível porque ele não era casado na Justiça com nenhuma delas. Do contrário, seria caracterizado bigamia, previsto como crime no Código Penal. O alvo da ação havia se casado oficialmente apenas com uma terceira mulher, de quem já estava separado há quinze anos. Por esse motivo, a relação não foi levada em conta na hora da decisão dos desembargadores.
Relacionamentos entre um homem e duas mulheres são comuns em vários estados brasileiros, independentemente da região. Para José Fernandes, a decisão da corte reconheceu apenas a existência de um fato real e suas implicações na Justiça. “A lei tem que normatizar o que já existe, proteger o que já está instituído. A Justiça deve acompanhar, ao longo dos anos, a realidade da sociedade”, justificou o magistrado.
Em seu voto, José Fernandes também informa que ficou demonstrado no processo a existência de duas relações afetivas públicas, duradouras, contínuas e contemporâneas, inclusive, com filhos, já que cada uma das mulheres deu à luz duas crianças do mesmo homem. Além desse cenário, ambas sabiam da existência uma da outra. “Se ele esteve no vértice de uma relação angular com duas mulheres, duas casas e duas proles, preenchendo em ambos os núcleos o papel de marido, provedor e de pai, é que cultivava a compreensão pessoal de que podia integrar duas famílias, e, no seu íntimo, nutria a aberta intenção de fazê-lo”, diz um trecho do voto do relator.
Ainda na opinião do desembargador, não havia razão jurídica para excluir uma das mulheres do entendimento de união estável. “Tutelar a apenas um dos relacionamentos, em desprezo do outro, implicaria clara ofensa à isonomia, por conferir tratamento distinto a situações substancialmente idênticas”, disse Fernandes.
O resultado de toda a polêmica nos corredores do TJPE é que a autora da ação conquistou o direito à terça parte de um imóvel no Recife, já que o restante do bem ficou para o antigo companheiro e a outra mulher. Ela também queria o valor de um automóvel, mas, o pedido foi negado.
Outras decisões judiciais inéditas em Pernambuco
2005 – Uma mulher consegue na Justiça o direito de interromper a gestação de um bebê anencéfalo
2008 – Um casal homossexual masculino de Natal adota, pela primeira vez em um pedido conjunto no Cadastro Nacional de Adoção, duas irmãs abrigadas no Recife
2012 – Um casal formado por dois homens registrou um filho legítimo. A criança foi concebida por meio de fertilização in vitro com material genético de um deles
2013 – Adotada por um casal quando criança, uma mulher conquistou o direito de acrescentar na certidão de nascimento o nome do pai biológico, junto ao do adotivo
2013 – Decisão garante que o homem que desejar registrar como seu um filho não biológico, com quem já convive de forma afetuosa, pode fazê-lo diretamente nos cartórios de registro civil.
Informações: DPNet