Reunida em Brasília, a direção executiva nacional da sigla defendeu uma oposição pragmática, com ações pontuais diante das propostas do futuro presidente. A possibilidade de diálogo é considerada se for “em função das demandas e urgências” do país.
A legenda, em nota, falou em moderar o governo, para que “prevaleçam as teses e agendas de interesse nacional”. Reiterou ainda que fará “defesa intransigente dos valores e práticas democráticas e da liberdade de imprensa”.
“A lógica do ‘quanto pior, melhor’ não nos cativa ou estimula, e não faremos do sofrimento dos brasileiros trampolim para o próximo pleito eleitoral”, afirmou o PSB no documento.
“Fomos colocados na oposição pelo eleitor, porque apoiamos um candidato que não ganhou. E também porque o que ganhou pensa diametralmente oposto ao que pensamos”, disse no encontro o presidente nacional da sigla, Carlos Siqueira.
A oposição do PSB, reforçou ele, “não será sistemática, mas em face de questões concretas, das proposições que o governo fizer”.
“Naturalmente, os prenúncios não são dos melhores.” Siqueira afirmou estar em contato com lideranças do PDT e do PC do B para articular uma coalizão crítica a Bolsonaro e defensora da democracia.
“Os partidos de esquerda não ficaram felizes com a declaração do PT de que há um comandante da oposição. Não haverá uma oposição, haverá várias oposições”, disse o dirigente.
O PSB, que atualmente tem 31 parlamentares, elegeu 32 deputados federais neste ano. Para o Senado saíram vitoriosos dois candidatos -hoje quatro pessebistas possuem mandato.
No comunicado divulgado à imprensa, o partido avalia positivamente seu desempenho na eleição. A sigla conquistou o governo de três estados (Pernambuco, Paraíba e Espírito Santo).
O resultado em São Paulo, onde Márcio França disputou a reeleição e perdeu no segundo turno para João Doria (PSDB), foi tido como bom. Os 48% de votos válidos que ele teve foram “um marco realmente significativo”, na visão do partido.
França, que participou da reunião desta segunda, defendeu que o PSB agora “faça aquele papel histórico de aglutinar” e busque construir pontes com outros partidos de oposição ao presidente.
“O primeiro caminho é fincar os conceitos democráticos”, afirmou, citando o papel do STF (Supremo Tribunal Federal) e da imprensa livre.
Apesar do apoio a Haddad no plano nacional, a legenda liberou os diretórios de São Paulo e do Distrito Federal. Na eleição paulista, França recebeu o apoio de aliados de Bolsonaro.
Passada a eleição, a avaliação do PSB é que, embora o ex-prefeito tenha sido derrotado para a Presidência, “a margem final de votos em favor do projeto de extrema direita não pode deixar de ser celebrada”.
Leia a nota oficial do PSB na íntegra:
AVALIAÇÃO DO QUADRO ELEITORAL E A POSIÇÃO DO PSB FRENTE À
NOVA CONJUNTURA NACIONAL
Passadas as eleições, impõe-se fazer uma avaliação do quadro político que se consolidou, localizando nele o Partido Socialista Brasileiro – PSB. A figura que emerge de uma apreciação mais geral nos é favorável, especialmente porque fomos reconhecidos pelos eleitores.
Neste sentido, considerando-se, inicialmente, os números relativos aos deputados federais, entramos no pleito com 21 posições e elegemos 32 parlamentares.
Os números foram um pouco menores do que o planejamento inicial, essencialmente por não termos reeleito 1/3 dos que buscaram esse objetivo. Ou seja, de 21 parlamentares 7 não conseguiram se reeleger. É um número expressivo, mas significativamente inferior à média geral das eleições de 2018, que produziu renovação de 47,3% na Câmara dos Deputados.
Ainda do ponto de vista comparativo, consideradas as bancadas de 2014 e 2018, o MDB vai de 66 para 34 deputados; o PSDB de 54 para 29; o PTB começa com 25 cadeiras e termina com 10. No caso do DEM, cabe fazer uma comparação específica, considerando-se a bancada posterior à janela partidária: os Democratas saem de 43 deputados e vão para 29.
Para o Senado Federal elegemos dois representantes: Veneziano Vital, da Paraíba e Leila Barros, primeira mulher a representar o Distrito Federal na Casa Alta. Em termos de governos estaduais, elegemos 3 governadores em primeiro turno: Paulo Câmara, em Pernambuco; João Azevêdo, na Paraíba e Renato Casagrande, no Espírito Santo.
Disputamos o segundo turno em quatro estados: João Capiberibe, no Amapá; Valadares Filho, em Sergipe; Rodrigo Rollemberg, em Brasília e Márcio França, em São Paulo, que lamentavelmente não lograram êxito — registrado que no Amapá, apesar das circunstâncias particulares da campanha, o senador Capiberibe esteve muito próximo da vitória. Além disso, elegemos uma mulher, Jacqueline Moraes, Vice-Governadora do Espírito Santo.
Faz sentido, ainda, qualificar um pouco a situação de São Paulo, com relação aos demais estados, em função do tamanho de seu eleitorado e relevância econômica. Apesar de não termos vencido, fomos realmente muito bem e Márcio França soube compor sua campanha, em um cenário que lhe era amplamente desfavorável, em razão da candidatura Bolsonaro. Ainda assim, alcançar 48,23% dos votos válidos é um marco realmente significativo.
2 Se aumentarmos o “zoom” de nossa análise, para avaliar de forma justa o desempenho eleitoral do PSB e as efetivas intenções do eleitorado, faz-se necessário considerar inicialmente, às claras indicações feitas em 2013, que não pararam de se ampliar, direcionadas aos agentes políticos e instituições partidárias.
Era claro desde lá o desejo de mudança das práticas políticas, a condenação ao toma lá, dá cá, a inconformidade com as manobras que visavam à perpetuação no poder. Como se respondeu a essas demandas da população? Com a proteção corporativa de agentes políticos vitimados por suas próprias condutas; com uma “reforma política” que atendeu prioritariamente aos que já possuem mandato; com a ampliação do autofinanciamento de campanhas, ou seja, com uma tentativa ampla e articulada de limitar a liberdade do eleitor, conduzindo-o subliminarmente a votar em benefício de um sistema político-partidário que repudiava, e que já se encontrava visivelmente carcomido.
O resultado dessas práticas quase oligárquicas foram o que vimos: o eleitor penalizou os que há muito faziam malabarismo para permanecer no poder e dentre esses, destacadamente, instituições e agentes políticos que associou à agenda antipopular de Michel Temer. Os desempenhos eleitorais do PSDB, PTB, DEM, MDB demonstram essa tese de forma cristalina.
No que se refere às eleições presidenciais, é importante registrar o fato de termos nos decidido por não realizar coligação formal com outras instituições partidárias no primeiro turno, decisão que permitiu uma melhor acomodação das disputas majoritárias nos estados e potencializou nosso desempenho para a Câmara dos Deputados.
No segundo turno, a emergência da extrema-direita e sua agenda de regressões nas conquistas sociais e democráticas nos levaram a apoiar a candidatura Fernando Haddad, na expectativa de formação de uma frente ampla em defesa da democracia, a ser composta por instituições partidárias, instâncias da sociedade civil e personalidades. Observe-se, nesse aspecto, que existe uma resistência claramente configurada, na sociedade brasileira, aos flertes com o apagamento dos efeitos deletérios da ditadura. Ainda que a vitória não tenha sido alcançada, a margem final de votos em favor do projeto de extrema-direita não pode deixar de ser celebrada, visto que por si só limita a liberdade com que poderia se movimentar o futuro governo, na implantação de suas pautas conservadoras.
Para completar a análise de cenário é obrigatório tomar em consideração, ainda, o fato de que chegou ao Brasil uma onda conservadora, que já faz carreira em muitas partes do mundo. Observe-se, quanto a esse aspecto, que democracias antigas e consolidadas passam por desafios semelhantes aos nossos, compreendidos aqui os Estados Unidos, Itália, França, Dinamarca, Suíça, além dos povos irmãos da América Latina — Argentina, Chile, Peru, Colômbia e Paraguai.
3 No Brasil, talvez com certa especificidade, essa guinada conservadora adquiriu, sobretudo os ares de um ajuste de contas com as “velhas práticas políticas” –como se demonstrou acima–, observando-se também uma predominância da agenda ultraliberal, “embalada” mais do que explicitada, em propostas predominantemente orientadas para as questões de costumes.
Por esse segundo aspecto, um partido como o PSB, que luta para ampliar o acesso a direitos, com destaque para a seguridade social — saúde, assistência e previdência –; que busca promover uma educação de qualidade; defende um projeto de desenvolvimento soberano para o Brasil; se preocupa com a modernização da indústria brasileira; defende ativamente os direitos humanos, se vê colocado na oposição pelo eleitor.
Como já havia ocorrido anteriormente com o governo Temer, a agenda política majoritária que emergiu das eleições nos encaminha para a oposição ao governo e às pautas que tem apresentado até aqui. Essa afirmação, contudo, não esclarece tudo e talvez não aborde o que é mais essencial: o que significa fazer oposição, quando a ação política de todos os agentes deve estar contida nos marcos firmados pela democracia e pela legalidade?
Não é o caso, por certo, de inviabilizar o governo, de lhe fazer oposição sistemática, mas de pressioná-lo até o ponto — sempre e onde for possível –, que prevaleçam as teses e agendas de interesse nacional e de nossa população. Ocorrem nesse terreno disputas legítimas; que oferecem, por sinal, a oportunidade para que toda a população se manifeste, no momento em que ocorrem os desdobramentos concretos das promessas de campanha — situação em que o conhecimento do “verdadeiro programa de governo” se realiza.
Isso considerado, estaremos sempre na linha de frente da defesa intransigente dos valores e práticas democráticas, da liberdade de imprensa e da organização social e política, posturas amplamente demonstradas em toda a história do PSB, que tem na resistência aos totalitarismos, uma das razões da sua existência, além de elemento basilar de sua práxis política.
Não faremos, contudo, oposição a partir de uma perspectiva abstrata, opondo sem qualquer mediação possível, visões de mundos que, em sua literalidade, são irreconciliáveis. Em nome dos brasileiros que precisam de emprego; que têm expectativas de aprimoramento do SUS; que desejam ir e vir de suas casas, caminhar para o trabalho em segurança –; na defesa de um projeto soberano de desenvolvimento, da qualificação tecnológica de nossa indústria, de uma concepção de futuro, que tenha entre seus elementos essenciais a articulação da economia criativa, exerceremos uma resistência sem tréguas, mas em uma perspectiva que busca o bem comum.
4 A lógica do “quanto pior, melhor” não nos cativa ou estimula, e não faremos do sofrimento dos brasileiros trampolins para os próximos pleitos eleitorais. Pelo contrário, trabalharemos sem descanso, para demonstrar aos que não nos confiaram seus votos nessas eleições, que somos uma oposição com brios e valores; com uma agenda definida em função das demandas e urgências do nosso País.
Que somos e seremos merecedores de uma confiança ampliada e que podemos, sim, contribuir para que o Brasil seja conduzido a um caminho de paz, prosperidade, respeito inflexível aos direitos humanos e acolhimento cuidadoso das aflições existentes, legítimas, que fizeram com que o novo a que muitos aspiram tenha, até aqui ao menos, uma face autoritária na política, ultraliberal na economia e retrógrada em termos de “costumes”.
Por fim, essa maneira de perceber a honrosa condição de oposição, que nos confiou o eleitor, recusa a simplicidade dos binarismos, que têm subordinado o país aos afetos, antes que à razão. Nos cabe, nos próximos quatro anos, construir o ponto ótimo, aquele que melhor equilibra as diferenças inerentes às sociedades humanas, de tal forma que respeitadas as nossas perspectivas político-ideológicas, as diferentes visões de mundo do eleitorado, nos sagremos situação, entregando o bastão da oposição àqueles que acabam de alcançar o poder, nas distintas instâncias do executivo e legislativo.
Brasília-DF, 05 de Novembro de 2018.
CARLOS SIQUEIRA
Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro – PSB